sábado, 31 de agosto de 2013

Sobre o prazer de descer na parada errada do ônibus

[caption id="attachment_572" align="alignnone" width="1024"]Foto: Mariana Gama Foto: Mariana Gama[/caption]

Ônibus em direção ao centro de Porto Alegre. Não muito cheio: era fim de tarde, quase noite, horário em que as pessoas e os coletivos mais voltam do que vão. Fim de uma tarde maravilhosa de sol - um sol daqueles que faz a gente esquecer a chuva, esquecer tudo que é cinza e frio, esquecer de qualquer coisa que não seja o brilho da luz e o azul do céu.

Embarco, passo a roleta, encontro um assento vazio. À minha frente, uma família - a mãe e o filho, portador de Síndrome de Down. Conversam algo que, por estar com fones de ouvido, eu não consigo ouvir a princípio.

Desligo a música e, sem remover os fones, passo a escutar o que dizem.

É um diálogo simples e que desenha-se rapidamente. O menino está ansioso para descer; a mãe, com um sorriso transbordante de amorosa paciência, diz que ainda faltam três ou quatro paradas. Imagino que, seja lá onde estivessem indo ou o que estivesse esperando por eles nesse local, a viagem fosse uma experiência inédita para o garoto. Falava com voz aguda e excitada, perguntando se faltava muito, a mão pousando no ombro da mãe - que, encarnação da tranquilidade, apenas pedia que ele esperasse um pouco mais.

É um menino obediente, ou ao menos tenta sê-lo. Silencia, aponta aos risos para um cão de rua que passa rapidamente pela janela, ajeita o descanso de braço primeiro para cima, depois para baixo. Mas é visível que não consegue distrair-se: não é capaz de livrar-se da vontade de chegar logo a seu destino.

De repente, o menino se levanta. Mal posso ver seus olhos, mas consigo perceber no perfil de seu rosto uma confiança renovada, de quem muito pensou e finalmente achou a solução para um grande impasse. Segura uma das barras metálicas do ônibus com uma mão, toca o ombro da mãe com a outra e diz:

- Mamãe, vamos descer!

- Mas ainda não chegamos, meu filho - responde ela, sem crispar o rosto, sem erguer ou mudar o tom da voz.

É neste momento que o menino completa, triunfante:

- Então: a gente desce agora e vai caminhando até lá!

Falou bem alto, ele. Creio que todo o ônibus ouviu. Sua mãe, no entanto, não se deixou levar pelo argumento: gentil, mas investida de sua autoridade de mãe, fez com que o menino voltasse a sentar. Faltava pouco mesmo para chegarem, de qualquer modo: mais duas paradas e desceram, de mãos dadas, o menino com um sorriso no qual cabia uma tarde inteira.

Foi uma pena que nenhum de nós, testemunhas involuntárias daquela singela cena, tenha se dirigido à carinhosa mãe e, com o máximo possível de educação, pedido que ela reconsiderasse sua decisão. Afinal, tinha razão o menino: fins de tarde como aquele, ainda banhados pelo sol da vida que sobreviveu a quase uma semana inteira de chuva e céu cinzento, certamente justificam que a gente desça duas paradas antes e vá caminhando até o destino.

sábado, 24 de agosto de 2013

Passos na chuva (II)

[caption id="attachment_442" align="alignleft" width="269"]Foto: likeyesterday / Flickr Foto: likeyesterday / Flickr[/caption]

A primeira parte da história pode ser lida aqui.

Deteve-se debaixo da marquise em uma decisão súbita, de improviso. Era estreita: precisou encostar-se de corpo inteiro na parede do prédio, as costas completamente alinhadas com o concreto para evitar que um dos ombros ficasse exposto à chuva agora fraca, mas sem dar sinais de ceder. Não que fosse uma precaução muito útil, já que estava completamente molhado há dias, mas parecia justo que ao menos naquele momento as gotas insistentes deixassem seu corpo em paz.

Chovia há tanto tempo que ele era incapaz de calcular.

Espanou os ombros com as mãos, tentando remover a água acumulada nas dobras da capa de chuva. Deu pequenos chutes no ar, como quem tenta acomodar melhor as botas plásticas nos pés. Removeu o capuz. Tossiu.

Seu lar estava distante. Não sabia mais se estava indo em direção a ele ou afastando-se: haviam sido ruas demais, esquinas todas parecidas demais, muitas poças d'água, muitas marquises. Havia andado muito, quase sem pausas: dos lugares por onde agora andava, tudo desconhecia. A única constante era o mau tempo. Sempre o mesmo céu cinzento, a mesma chuva fina e persistente. O som monótono da água caindo nos telhados, nas calçadas. Pouco vento. Nenhum relâmpago.

Onde quer que fosse, a chuva ia com ele.

Tinha saído de casa do modo como costumava fazer todas as coisas: ao sabor do momento, sem planejar nada, atendendo o chamado surdo de um impulso sempre mais forte do que ele próprio. Tinha sido uma semana de alguns gritos e muitos silêncios, de olhares que tudo observavam e julgavam, sem jamais cruzarem um com o outro. Viu na chuva uma chance de limpeza, de fugir ao silêncio acusatório daquela casa e finalmente ter a chance de ouvir os próprios pensamentos. Apenas jogou a capa de chuva sobre as roupas gastas, calçou as botas e murmurou uma despedida pobre, algo sobre estar de saída e não ter hora para voltar. Ninguém tentou detê-lo e então ele foi em direção à chuva, ajeitando o capuz sobre a cabeça, fechando o último botão logo abaixo do pescoço, escondendo as mãos dentro dos bolsos enquanto lamentava não ter pego luvas para aquecê-las.

Só mais tarde entendeu que a chuva, na verdade, queria capturá-lo.

Como voltar?, perguntava a si mesmo. Os ecos da briga terrível já haviam há muito silenciado dentro de si. Sentia que, se reencontrasse sua trilha, a volta ao lar não seria de palavras ásperas e ressentimentos, mas um reencontro suave, de silenciosos pedidos mútuos de perdão. Desejava voltar. Estava, porém, cercado pela estática da chuva; o ruído das gotas contra o asfalto era ele próprio um estranho silêncio dentro de sua alma. Não sabia onde estava. Não fazia ideia de que rumo tomar, qual a esquina correta, por quais ruas seguir. Andava a esmo, buscando uma súbita compreensão que indicasse a trilha de retorno para si mesmo.

Nada havia. Apenas o som fraco e insistente da chuva ao seu redor.

Vestiu o capuz. Olhou brevemente para a rua silenciosa diante de si: janelas fechadas, poucas luzes acesas. Uma pequena cerca protegia os limites de um terreno baldio.

Lançou-se novamente à rua. Em um abraço apertado, a chuva uniu-se a ele.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Trinta e três

Acredito que, em um momento já distante da minha trajetória, eu fui uma pessoa jovem. Não um jovem do ponto de vista metabólico, bem entendido; refiro-me mais a uma juventude de espírito, uma ingenuidade de quem tudo aprende, uma sadia ignorância diante do mundo e de todas as coisas. Houve sim um tempo (dele não recordo, mas sou capaz de jurar) em que eu nada sabia de coisa alguma, não trazia em mim nenhum temor ou incerteza, nenhum tipo de ansiedade, busca ou expectativa. Lindos dias devem ter sido aqueles, no quais a vida explicava e justificava a si mesma, momento único e interminável que eu era todo o universo e isso bastava. Encanto que se rompe tão logo é percebido, incapaz de sobreviver à mais singela consciência de si mesmo.

Lembro que um dia eu discutia com meu irmão sobre a idade que tínhamos e o ano em que cada um de nós tinha nascido. Meus pais estavam ausentes nesta ocasião; quem tomava conta de nós era um dos meus tios, que neste momento estava na cozinha fazendo uma coisa qualquer. Eu discutia com meu irmão aos gritos, como imagino que façam todas as crianças de todos os lugares, tentando convencê-lo de que eu tinha nascido naquele ano mesmo, naquele exato 1985 em que vivíamos. Era um raciocínio evidentemente absurdo, mas hoje consigo compreendê-lo até certo ponto: eu simplesmente não tinha, até aquele momento, a consciência da passagem do tempo. Para minha mente infantil, o agora era eterno, o passado era apenas um conceito vago que não tinha qualquer importância na minha existência. Encanto tênue que durou pouco mais de cinco anos e que se desfez quando meu irmão, indignado com minha insistente afirmação, chamou nosso tio da cozinha e pediu que viesse, que nos ajudasse a resolver de uma vez a questão.

Uma vez inteirado do dilema, e percebendo minha extraordinária empolgação, perguntou-me em que ano, no fim das contas, eu achava que tinha nascido. Neste mesmo ano, disse eu triunfante: afinal, eu estou vivo neste ano, então esse é o ano em que nasci. A risada de meu tio, ao ouvir a pequena e sincera bobagem que eu dizia, é inesquecível: não foi algo cruel ou debochado, mas eu diria que ela foi o som que o encanto fez ao se quebrar em mim. Tu tens cinco anos, guri, ele respondeu ainda rindo, como é que tu ia ter nascido esse ano ainda e já estar com cinco anos? Se tu tens cinco anos e se estamos em 1985, então tu nasceu em 1980, completou, acreditando sinceramente que estava me ensinando algo útil e importante. Meu irmão começou a gritar alegremente, comemorando o meu fracasso, mas lembro que meu tio repreendeu-o dizendo que ao menos eu era um guri muito novo, que ele era mais velho e por isso deveria saber melhor do que eu quantos anos tinha e em que ano tinha nascido. A essa altura, porém, creio que a questão toda já não me importasse mais - afinal, eu tinha um novo e imenso problema com o qual lidar, muito mais terrível e permanente do que uma simples ignorância sobre o ano em que nasci. Agora, mais do que saber que o tempo passava, eu era capaz de senti-lo. De percebê-lo. Naquele instante, precisamente naquele instante, eu entendi passado e futuro. Tornei-me velho.

Hoje em dia, sou perfeitamente capaz de contar a passagem do tempo. Tenho exatamente 33 anos de idade, vinte e oito a mais do que tinha naquele distante começo de noite, em um 1985 que jamais voltará a existir senão na minha imperfeita memória. Deu tempo de viver muita, muita coisa mesmo nesse período. Vi muito, ouvi outro tanto, esforcei-me sempre para entender, aprender. Não sei até que ponto tive sucesso, nisso e em tantas outras coisas. Superei grandes barreiras na minha existência: aprendi a comer feijão, a amarrar os cadarços do tênis, a subir num ônibus e descobrir sozinho onde deveria descer. Sobrevivi a doenças, ferimentos, acidentes domésticos. Vivenciei sem muitos problemas a troca de dentes, as primeiras brigas, as primeiras mentiras e decepções, o primeiro beijo. Amei e fui amado por diferentes pessoas, com diferentes graus de sincronia e reciprocidade. Quis coisas que não pude ter e sobrevivi à ausência delas. Descobri a arte, a ironia, a amizade desinteressada, o sexo e o futebol. Aprendi a ser míope. Assumi a barba e a careca mais ou menos ao mesmo tempo. Apertei a mão de desconhecidos no meio de ruas desertas, fui assaltado, recebi gestos de pura bondade da parte de gente que nunca mais vi na vida. Já bebi para tentar esquecer uma mulher, o que obviamente não funcionou. Andei muito, muito mesmo, por ruas conhecidas e ruas que jamais tinha visto antes. Aprendi a gostar de ficar sozinho e de tomar banho de chuva. Antes de completar quinze anos, perdi meu pai. Descobri que sou jornalista, que conto histórias com alguma propriedade e que sou absolutamente incapaz de entender como diabos se calcula um logaritmo. Fiz faculdade, fiquei desempregado, morei praticamente de favor em um sótão de uma cidade desconhecida. Mais de uma vez fiquei acordado a noite toda exclusivamente pelo prazer de contemplar o nascer do sol. Tive que encarar os fatos algumas vezes, já disse a verdade quando era muito difícil e pedi perdão a pessoas que decepcionei. Já achei que estava tudo perdido, já tive muita pena de mim mesmo e já quase fiquei sem esperança. Nunca pensei em tirar minha própria vida, mas já achei que não restava muita coisa senão morrer. E de alguma forma sobrevivi a tudo isso, ficando mais forte e ciente de mim mesmo pelo caminho, em uma trilha meio acidentada que me trouxe até aqui, até esse preciso instante em que escrevo um texto sobre mim mesmo sem saber exatamente o que, no fim das contas, estou tentando dizer. Trinta e três anos.

Qual é o resumo de um ser humano? Qual é o seu extrato, o que ele é e segue sendo além de todas as coisas que disse e fez, algo que sobra dele quando tudo mais é removido e que - sabe-se lá - seja capaz de sobreviver a ele próprio, muito depois de sua morte? Haverá alguma grande obra, algum tipo de legado que possa ser descrito e quantificado, ou será que somos mesmo apenas as sombras na parede, pés que andam pela grama rala sem deixar sequer as pegadas para trás - mas que fazem o trajeto tantas e tantas vezes que acabam gerando o atalho por onde os outros andarão, caminho que segue lá muito depois de termos mergulhado na inexistência? Vale mesmo a pena esse esforço todo, essa dedicação quase maníaca de colocar uma palavra depois da outra, em um mundo onde tudo é tão tênue e acaba tão rápido e logo vira apenas lembrança ou nem mesmo isso? De que vale o futuro em um mundo onde o presente nos foi negado e somos, cada vez mais e eternamente, escravos do passado que construímos a cada respiração?

No que tange a todas essas indagações, sou um cronista dos mais relapsos. Não sou capaz de respondê-las e, mesmo que eventualmente fosse, certamente declinaria da tarefa. São questões, de qualquer modo, que me parecem bem mais úteis perguntadas do que respondidas. Talvez seja delas que fui tirando, depois de cada tropeço, a vontade de continuar. Talvez por meio delas eu tenha sobrevivido ao primeiro e mais definitivo dos meus desafios: achar o que fazer de mim mesmo quando percebi que o tempo existia e, uma vez existindo, já estava próximo de acabar. Esse, amigos e amigas, é o tempo e a vida que estou vivendo - é, ao mesmo tempo, o melhor e o pior dos tempos, o mais extraordinário e o mais insignificante, e é todos esses tempos de uma vez só. E estou em paz. Sou velho, nunca mais serei jovem novamente, a inconsciência de apenas viver sem que nada mais importe já me foi negada há tempo e creio que não deve mais voltar. Mas a vida cresce em encanto a cada instante. Quanto menos eu tenho, mais incrivelmente belo e precioso me parece o que ainda resta. E mais grato me sinto.

Meu nome é Igor Natusch, tenho 33 anos e nunca me senti tão vivo em toda a minha vida.

sábado, 10 de agosto de 2013

Observação

É estranho, enquanto observador, saber-se não observado. Observar é uma arte negligenciada em nosso mundo: poucos observam. Olho todos com os olhos de quem não é alvo dos olhares de ninguém. Observo só. Então, sei que pouco provável é que me observem, esteja eu onde estiver, seja lá qual fatia do mundo eu esteja a observar.

Saber isso traz a mim uma estranha liberdade. Quase como saber-se seguidor de uma doutrina quase esquecida, uma fé secreta. Algo que existirá enquanto o mundo for mundo. Uma pertença em meio à solidão.

A solidão não é claustro nem castigo, nesse caso. A solidão sou eu. Eu sou minha própria solidão. Minha fronteira sou eu mesmo - além de mim, o que existe? Jamais saberei: da minha existência perante o mundo, nunca perceberei mais do que pálidos e imprecisos reflexos. Dos olhos que porventura me enxergam, pouquíssimos me verão, nenhum saberá de fato quem sou.

O que me constitui é também a ausência de olhares sobre mim. Existo em mim mesmo. E estou completo. Estou em paz.

sábado, 3 de agosto de 2013

Passos na chuva (I)

[caption id="attachment_563" align="alignnone" width="1024"]Foto: Henti Smith Foto: Henti Smith[/caption]

Foi numa noite de chuva que ele saiu para nunca mais voltar. Lembro muito bem: era uma chuva igualzinha a essa, de gotas grossas e insistentes, chuva que bate no asfalto com um barulho que lembra coisas que já não existem senão dentro de nós. Uma chuva de noite fria, daquelas geladas mesmo. E foi justamente em uma noite como essa, exatamente como essa, que ele calçou um par de botas, vestiu uma capa de chuva por cima das roupas de ficar em casa e saiu. Não sei quando volto, ainda lembro dele dizendo, em voz não muito alta, como quem não quer fazer muito alarde de si mesmo. Mas olha essa chuva, onde é que você vai, ainda perguntei. Vou caminhar, foi o que disse, e então disse de novo Não sei quando volto, e foi em direção à porta sem falar mais nada. Passou duas voltas na chave antes de sair. O último som que dele ouvi foi seus passos sumindo no corredor, rumo às escadas.

Não olhei pela janela, então não sei que rumo tomou.

Desde então, sigo aguardando que retorne. Mesmo quando faz sol, mesmo quando há calor e a luz da grande estrela brilha quase insuportável nas janelas do outro lado da rua, mesmo assim sinto que ainda chove em algum lugar, que em algum ponto do mundo ainda é céu fechado, que ainda faz frio em alguma esquina distante muito além dos meus sentidos. Porque ele segue caminhando lá fora, e a chuva o acompanha onde quer que ele vá; isso eu sei, acima de dúvidas.

Será que ele volta, algum dia?

Quando chove do lado de fora, assim mesmo do modo que está chovendo agora, essa chuva fria que bate no asfalto e faz um som que a gente escuta mais aqui dentro da gente do que em qualquer outro lugar - nessas noites eu fico aqui, sentado de costas para a janela, sem olhar para a porta, esperando ele voltar. Aguço os ouvidos e tento escutar qualquer coisa além do som monótono e insistente das gotas no asfalto. Quero ouvir os passos familiares no corredor, a chave girando lentamente na porta que me separa do mundo e que não me animo a deixar aberta. Quero vê-lo usando a mesma capa de chuva, as botas sujas molhando o chão, a voz dele se erguendo apenas o suficiente para ser ouvida enquanto diz Eu sei, acabei demorando um pouco, desculpe.

Breves palavras sobre voltar às aulas

Ultimamente, eu tenho sonhado quase todas as noites que estou voltando a estudar. Às vezes, é como se eu estivesse entrando em outra faculdade, em um local estranho e com colegas desconhecidos; em outras, sou mais novo e estou retornando à escola - às vezes o velho Visconde do Rio Grande onde fiz todo o primeiro grau, às vezes algum outro lugar que não conheço e provavelmente só existe no meu subconsciente. Nem sempre esse retorno às aulas é o aspecto central do que estou sonhando - muitas vezes é apenas um detalhe, um cenário onde coisas ocorrem ou apenas uma ideia que flutua difusa em minha mente enquanto outros eventos se desenrolam. Seja onde e como for, é sempre um retorno: sinto-me como quem não frequenta a aula há tempos, alguém que volta de recesso ou mesmo que abandonou seus antigos compromissos em nome de um recomeço, de um novo aprendizado.

Não sei interpretar isso muito bem. Sonhos não costumam ser muito literais, de forma que eu não acredito que o lado escuro da minha mente esteja dizendo largue tudo, largue tudo agora mesmo e volte a estudar. Mas talvez ele esteja me pedindo disposição renovada para alguma coisa - para aprender, para conviver e viver. Talvez existam coisas dentro de mim que ainda preciso contemplar, e seja necessário esse retorno. Talvez seja o meu encantamento da criança que precisa voltar... Ou talvez seja apenas a simbologia do recomeço. Estamos sempre recomeçando, não é? Coisas acabam na nossa vida o tempo todo, e às vezes a gente não entende imediatamente, às vezes não queremos entender, às vezes apenas fechamos os olhos, o coração. Pode ser que o recado seja: algo acabou, é hora de algo começar. Permita, permita-se. Talvez seja apenas isso: preciso retornar a mim mesmo. Corrigir ligeiramente a rota, para que ela diga ainda menos sobre o mundo, um pouco mais sobre mim mesmo.

Não sei, não sei. Mas estou tentando apreender. Aprender, enfim.