domingo, 5 de janeiro de 2014

Um pouco mais sábio, mas nem tanto

[caption id="attachment_644" align="alignleft" width="210"]Foto: Divulgação Foto: Divulgação[/caption]

Na última sexta-feira, compareci à formatura de duas queridas amigas, agora bacharéis em Jornalismo pela PUCRS. Gosto de formaturas: apesar da cerimônia sempre ser mais longa do que o necessário (especialmente pela enxurrada de homenagens e discursos, que são necessários mas poderiam ser menos prolixos) a felicidade de muitos presentes é genuína e há bom espaço para reflexões. No meu caso, boa parte dos pensamentos voltam, talvez de forma um pouco egoísta, na minha própria direção - fazendo as contas de quanto tempo passou desde minha colação de grau, o estágio em que me encontro enquanto profissional de Jornalismo, o quanto estou conseguindo retornar à sociedade do investimento que foi feito em mim e por aí vai.

Não sei se as formaturas de todos os lugares são assim, mas na PUCRS (e na UFRGS, onde me formei) cada formando escolhe uma música para tocar enquanto vai ao centro do palco receber o canudo. Para muitas pessoas, a escolha do tema musical é muito simbólica e importante; para outros, talvez mais corretos, é apenas a chance de colocar algo bonito, emocionante ou apenas para tocar. Eu pertenço certamente ao primeiro grupo: passei um bom tempo pensando em que música usar quando da minha formatura. Deve ter sido inclusive uma dos poucos preparativos que realmente ocupou minha mente naquele período, onde a necessidade de dividir trabalho e monografia já era complicação mais que suficiente.

Tive várias opções, e apenas faltando umas duas semanas para a cerimônia consegui me decidir. A música que escolhi chama-se "Don't Stop" e foi gravada por uma banda britânica chamada Cock Sparrer. Eles têm uma certa má fama por serem uma banda Oi (estilo próximo do punk fortemente associado com skinheads) e os incidentes após o até hoje único show no Brasil, em 2011 (quando um punk foi morto por carecas nas redondezas da casa onde o grupo tocou) só pioraram a imagem deles por aqui. Mas é algo absolutamente injusto: o som dos caras (que estão por aí desde a metade dos anos 70) é uma das coisas de espírito mais elevado que conheço, caras com uma capacidade de cantar o "working class hero" como poucos no mundo conseguem igualar. Me formei no começo de 2008, e no ano anterior eles tinham lançado "Here We Stand", disco de onde sai a música que escolhi.

"Don't Stop" é uma música escrita por cinquentões que ainda tocam rock do mesmo modo que faziam quando moleques e não pretendem parar tão cedo - algo justo, já que de fato não há absolutamente nada de errado nisso, pelo contrário. São os tiozões dizendo para os recém-chegados algo tipo baixe a crista, garoto, estamos aqui há tempo e ainda manjamos da coisa e de qualquer modo sem humildade não se vai a lugar algum.

É uma letra belíssima - rude, é claro, mas profunda e poética como só conseguem ser as coisas simples ditas com convicção e senso de verdade. E de certo modo era como me sentia ao sair da faculdade, e é como me sinto ainda hoje e provavelmente vou me sentir nos anos que virão: um pouco mais sábio do que antes, mas nem tanto assim. Um pouco desligado das coisas talvez, mas ainda tendo algo a dizer. E eu realmente olho ao redor e as coisas não mudaram quase nada, e realmente as pessoas vêm e vão e são milhares de rostos que eu jamais conhecerei - estão lá, exigindo minha presença, o olhar que só eu posso dar a eles. O olhar que é o meu dever. Eu saquei como são as coisas e nao estou para brincadeiras - há algo sério que precisa ser feito e eu estou disposto a fazer minha parte. Foi para isso que virei jornalista e é isso que me move adiante, todos os dias. Não esqueci como é. E eu ainda fico indignado do mesmo modo que quando entrei na faculdade, do mesmo modo que era muito antes de eu entrar na faculdade - e a chama, amigas e amigos, ela ainda arde dentro de mim. É a canção de verdade desses cinquentões, e a verdade deles é análoga à minha, mesmo tão diferente - peguei ela emprestado, e me serviu muito bem. Me serve ainda hoje.

Creio que foi uma boa escolha.
Obrigado, caras.

http://youtu.be/qtocmE-uo-M

Well I ain’t change, not as such
A little bit wiser but not that much
I might be a little out of touch
But I’ve still got something to say

And I look around and it’s much the same
A different generation with a brand new name
I’ve got it sussed, I’m not playing game

Same day same old story
All it takes is a little bit of common sense

Don’t stop believing, don’t stop believing
Don’t stop being yourself

People come and people go
There’s a thousand faces I’ll never know
I’m lost in a crowd but even so
I’ve still got something to say

I’m not surprised, what do you expect?
It’s got like this cos of your neglect
And now it’s time to show some respect

But it’s the same day same old story
All it takes is a little bit of common sense

But I still get angry, I still get mad
Just like I did when I was a lad
But the flame’s still burning deep inside of me
Inside of me

Don’t stop believing, don’t stop believing
Don’t stop being yourself