Madrugada de sábado para domingo, pouco antes das duas da manhã. Avenida Paulista, uma parada de ônibus, sem dinheiro para táxi e aguardando um improvável ônibus que me leve para casa. Estava quase sozinho: apenas dois homens, abraçados e trocando leves e carinhosos beijos, aguardavam sentados em um pequeno jardim próximo de onde eu estava. Após a lenta passagem de longos minutos, vejo um jovem casal se aproximando, em passos lentos e trôpegos: vinham direto para a parada, de modo que era impossível não vê-los. Deviam ter no máximo dezoito anos, provavelmente menos. A moça vestia uma blusa folgada e bermudas jeans bastante justas, em um conjunto pouco harmônico que parecia ter como objetivo esconder a beleza de quem o vestia. O rapaz, por sua vez, tinha cabelo espetado, roupas amassadas e carregava uma garrafa de vodka barata, que dividia com a garota durante a caminhada. Foram indo até a parada e, tão logo chegaram, optaram por sentar no chão, a uns quatro ou cinco metros de onde eu estava.
Beijaram-se rapidamente, mas a moça não parecia estar muito disposta a demonstrações de afeto ou desejo, afastando o rapaz de si com um movimento de braço. Ambos estavam muito bêbados, a moça talvez um pouco pior. Não duvido que cogitassem dormir ali mesmo, no meio da calçada, pela simples impossibilidade física de buscar outra opção. A menina chegou a deitar-se, encostando a cabeça no colo do rapaz, mas logo ergueu-se, e uma série de movimentos convulsivos deixou claro que ela iria vomitar. Ao seu lado, o rapaz manteve uma das mãos sobre os ombros da moça – e logo ela começou a soltar grandes golfadas de vômito, manchando a calçada com um líquido de cor amarelo-alaranjado. Não sei se enojado pela cena ou apenas solidário, eis que o rapaz também se curva, treme um pouco e começa a vomitar, antes que a menina que o acompanhava terminasse a sua parte. Era uma cena estranhamente pungente: um jovem casal de perdidos, vomitando ao mesmo tempo, a mão do rapaz ainda sobre o ombro da menina, a menina encostando sua mão nas costelas do rapaz, como se um fosse amparando o outro naquela operação difícil e primal.
Por fim, ambos pararam e se arrastaram um pouco para longe do vômito, recostando-se um sobre o outro num dos cantos da parada de ônibus. Creio que acabaram dormindo. Fiquei mais uns quarenta minutos no local, e nesse período não vi qualquer movimento significativo da parte deles. Quando subi no ônibus que surgiu como um milagre no meio da madrugada, me permiti olhar para trás uma última vez. Ambos estavam lá, dormindo abraçados de uma maneira tocante em sua fragilidade quase ridícula. Fosse como fosse, era tarde, a noite já tinha acabado, e era hora de deixar que os dois sumissem na torrente do presente, rumo à eterna memória.