segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

O som de nossos passos já ecoa no passado

Ao nosso lado, dois fantasmas sempre se erguem. Um deles suspira das coisas que foram ou poderiam ter sido; o outro sussurra das coisas que devem ser, das que podem existir e das que jamais serão. Nenhum deles fala de nós. Estando conosco, ambos querem estar em outro lugar, e exigem de nós a presença em um ponto do tempo que não é mais nosso ou que não nos pertencerá jamais. E nós consentimos, em silêncio submisso, cúmplices de uma vida que, entre ter sido e vir a ser, acaba nunca sendo de verdade.

Há pressa. Por onde andamos? Um rosto passa por nós na rua, um borrado impreciso de traços físicos e feições, alguém sem nome que mal é contemplado na corrida de cada instante - e então já não existe mais, está extinto para sempre, já foi e nunca mais voltará. Não há mais tempo; perdeu-se. E não há tempo sequer para lamentar o que quer que seja - pois lá está outro borrão, outro ser humano que não existe mais, outra figura que passa indo para algum lugar longe do nosso mundo e da nossa existência. Avançar tornou-se o centro de todas as coisas - enchendo nossa vida de passado, rumo ao futuro eternamente inalcançável. Avançamos, e vamos ficando para trás pelo caminho. Acotovelamos uns aos outros na busca por uma réstia de luz.

É o sol. É ele que nos mantém em movimento.

Um passo começa antes do outro encerrar-se; mal lembramos a sensação de ter os pés no chão. Há muito a ser feito, há muito a ser visto, dito, sentido, vivenciado. O som de nossos passos já ecoa no passado - e o futuro, onde está? É um fantasma. Somos fantasmas. Estamos permanentemente em suspenso, existência que foge dos dedos antes mesmo que possa ter sido.

Ninguém jamais dorme. A cidade não descansa; somos eterna vigília. Olhos abertos, tentando enxergar algo presente em meio às ausências. Se tudo foi e tudo precisa ser feito, como algo poderá permanecer? Estamos cercados de penumbra; andamos para todos os lados, cada vez mais rápido, em busca de uma certeza escondida lá longe, além das nuvens que cobrem o céu.

É o sol. É ele que nos mantém em movimento.