domingo, 22 de abril de 2012

A escadaria e o horizonte


Por aquela rua jamais havia andado. Era um caminho de calçadas mal cuidadas, de casas humildes, de árvores cansadas e paralelepípedos. Ainda não era noite, embora o sol há muito tivesse sumido, deixando apenas uma lembrança de si para trás, como um amigo tentanto iluminar o trajeto da noite que chegava para ocupar seu lugar.

Poucos estavam naquela rua àquela hora do sábado. Nenhum reparou nele. Desceu o caminho a passos lentos, cuidando onde pisava, temendo talvez tropeçar em algum buraco ou pedra solta. Em alguns momentos, abandonou a calçada e foi pelo meio-fio; nenhum automóvel passou para importuná-lo. Foi descendo, rumo ao que acreditava ser a esquina de uma avenida conhecida, até ver em um relance a pequena escadaria que levava a uma elevação de terreno. Parado em frente aos degraus, ouviu som de gritos e risadas. Uma praça, pensou, algo admirado de que uma rua tão pouco encantadora pudesse ter uma praça.

Subiu.

Ao topo da escadaria, encontrou o horizonte.

Havia uma lua. Uma imensa lua cheia, grande como não lembrava de ter visto, brilhando amarela contra o violeta do céu indeciso entre a noite e o dia. Uma lua que há séculos não via, em um horizonte do qual tinha até esquecido, e que ali estava paciente esperando por ele. Há quanto tempo? Nunca soube, e mesmo assim já havia esquecido. Sentiu-se arrebatado pelo reencontro, percebeu a satisfação da imensa lua em revê-lo e permaneceu de pé, no topo da pequena escadaria, sua vida pregressa e futura encontrando resumo naquela súbita e inesperada epifania.

Ficou olhando a lua por um longo tempo. E lá permaneceu, décadas depois de ter ido embora, lembrança que encontra no crepúsculo a trilha para a existência eterna.